09 junho 2005

Vale a pena fazer reapreciação!

Notas de exames disparam revisão
Explorar a lei das provas nacionais é trunfo para 70% dos alunos (MANUEL MOLINOS)

Com os exames nacionais do 12º ano à porta, um dado é certo: pedir a reapreciação e, posterior, reclamação das classificações atribuídas às provas, com as quais não se concorda, é aconselhável, pode trazer resultados surpreendentes e ser decisivo para a entradano Ensino Superior.Os números do Ministério de Educação não deixam dúvidas. Das 416.312 provas realizadas na primeira fase dos exames nacionais do ano passado, foram solicitadas 16.576 reapreciações, das quais 11.887 subiram a nota, ou seja, cerca de 72%. O exame de Biologia (102) foi o que registou maior número de subidas, seguindo-se o de Matemática e o de Português B.A discrepância entre as classificações atribuídas no exame e aquelas que resultam das reapreciações são visíveis e públicas. Mas pouco compreensíveis (ver peça ao lado).Tomando como exemplo as notas da 1ª chamada de uma escola secundária do Porto, conclui-se que 84,7% dos resultados foram alterados. Recorreram 72 alunos, dos quais 61 subiram e 11 mantiveram a classificação. Nenhum desceu. O cenário foi idêntico na 2ª chamada.Dos 30 alunos que pediram reapreciações, 22 subiram, oito mantiveram. Mais uma vez, nenhum desceu. Em alguns casos, as subidas foram de quatro valores, variáveis que podem ditar a entrada no Ensino Superior. Às vezes, apenas duas décimas decidem vidas.A situação repete-se noutras escolas contactadas pelo JN, onde a percentagem de subidas nas reapreciações ronda os 70%, reflectindo a média nacional.Questão de médiasAtente-se ainda que a maior parte dos alunos só pede reapreciação das classificações que afectam a sua média geral. Portanto, muitos outros resultados poderiam subir, pondo em causa a credibilidade dos "rankings" das escolas.Alguns alunos, graças à classificação revista, entraram no curso superior que pretendiam. Foi o caso do Francisco, estudante do Porto. Depois de ter obtido 14,1 valores na classificação do exame de Psicologia, pediu a reapreciação da prova. Subiu um valor. Nãosatisfeito, avançou com a reclamação. Subiu mais dois valores, fixando a classificação em 17. Francisco entrou em Medicina.O exemplo é parecido com outras situações analisadas pelo JN. A Joana obteve no exame de História de Arte 13 valores. Na reapreciação manteve a classificação. Após a reclamação, a sua nota passou para 17,8.Um outro estudante entrou na universidade depois de ver a sua nota do exame de Matemática passar de 8,9 para 9,5 valores. E os casos repetem-se.Alguns conselhos executivos das escolas secundárias estão, neste momento, a apelar aos professores para apoiarem os alunos no processo de reapreciação/reclamação das provas. Refira-se que as classificações da 2ª chamada são afixadas no dia 1 de Agosto, quando amaioria da classe docente está de férias. Os alunos normalmente recorrem aos seus professores que, voluntariamente, os ajudam a elaborar a alegação da reapreciação.Manual do recursoSe não concordar com a classificação de uma prova, o aluno pode pedir recurso?- Sim. Esse pedido é feito ou pelo encarregado de educação, ou pelo aluno se for maior de 18 anos, ou se fez o exame como auto-proposto.Se após a consulta da prova o aluno pretender recorrer, o que é que faz?- Dois dias após ter consultado a prova, faz um requerimento em impresso próprio, acompanhado de uma alegação, isto é, expõe as razões que o levam a discordar da classificação.Que características deve ter a alegação?- A alegação deve identificar expressamente as respostas cuja classificação se contesta. Os fundamentos da contestação só podem ser de ordem científica ou de juízo sobre a aplicação dos critérios de correcção.O aluno poderá baixar a classificação após a reapreciação?- Sim. Contudo, o aluno não pode reprovar se já tiver sido aprovado.Depois de conhecido o resultado da reapreciação, se não concordar com a classificação, o que é que o aluno deve fazer?- Pode fazer uma reclamação no prazo de quatro dias úteis a contar da data da comunicação do resultado da reapreciação.Reapreciaçõesvão mudareste anoÉ no círculo de correcção, reapreciação e reclamação que se tornam evidentes as discrepâncias nas classificações. O Júri Nacional de Exames (JNE) minimiza a questão e afirma que as diferenças situam-se, na média nacional, na casa das décimas.A actual presidente do JNE, Elvira Florindo, que falou ao JN na qualidade de vice-presidente do júri do ano passado, admite "que errar é humano", mas sublinha que "algumas disciplinas têm critérios de correcção abertos", permitindo interpretações diferentes deprofessor para professor. Reitera que, na reapreciação, "a avaliação incidia apenas numa questão e não em toda a prova", originando uma classificação diferente por parte do corrector. Este ano lectivo, as reapreciações já irão recair sobre o conjunto do exame.Reclamação justifica-seApesar das justificações, atente-se que as reapreciações apresentadas pelos alunos fundamentam-se também nos critérios de correcção que lhes são fornecidos. E, curiosamente, as reapreciações que, no ano passado, registaram maior número de subidas incidiram sobre as disciplinas de Biologia e Matemática, que têm critérios de correcção objectivos.Por outro lado, os correctores desconhecem que as classificações que atribuíram às provas reapreciadas foram alteradas, e não existe qualquer penalização, nem mesmo um alerta, no caso de uma prova ter sido incorrectamente corrigida. Mais, "a leitura de algumasreapreciações - a que se tem acesso se se interpuser a reclamação - mostra que a fundamentação do parecer apresentada pelo novo corrector ou não existe, ou é bastante deficiente e incompleta. Daí que se justifique, no caso da discordância com a classificação proposta, a apresentação da reclamação", refere uma professora ao JN.Enquanto os exames nacionais são corrigidos, obrigatoriamente, por professores que leccionaram as respectivas disciplinas do 12º ano, as reapreciações são feitas por docentes que se propõe para a tarefa.
Jornal de Notícias, 25/4/2002